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domingo, 17 de julho de 2016

"Buy me the sky"

Tarde de domingo, tanto programa interessante para se fazer fora de portas desfrutando do sol e do calorzinho bom que se faz sentir…e eu aqui, na varanda de casa a fazer o que mais me apetece: ler e escrever. Uma chávena de café e o chilrear dos pássaros como companhia, aproveitando o sossego das crianças e a disponibilidade dos avós para os entreterem. O café é vietnamita (delicioso!), o livro é da escritora Xinran mas as ideias que fervilham e lutam por sair são bem minhas.
Xinran – jornalista, apresentadora de rádio e escritora – é, acima de tudo, mãe e mulher. Uma mulher chinesa, nascida em Pequim há quase 60 anos. A viver em Inglaterra desde 1997, divorciada de um chinês, casada com um inglês, as suas palavras no livro “Buy me the sky – The remarkable truth of China’s one-child generations” cativaram-me desde o primeiro parágrafo.
Confesso que a autora me tinha passado despercebida até ao ano passado, mas a mudança para a grande metrópole asiática fez naturalmente surgir em mim a vontade de explorar a cultura e a História chinesas.
Há uma série de questões que são colocadas logo no inίcio do livro e que me deixaram a pensar. Porque é que há uma diferença tão profunda entre as cidades e o campo? Como é que podem existir décadas de separação entre lugares dentro do mesmo paίs governado pelas mesmas leis? Quem é que representa o povo chinês hoje em dia? Os homens de negócios que saltam de aeroporto em aeroporto ou os pequenos agricultores sem qualquer instrução que percorrem a pé vilas e aldeias em busca de um meio de subsistência? Se a China é um paίs comunista, então por que motivo os pobres das zonas rurais não têm qualquer tipo de apoio do Estado? E se é um paίs capitalista, por que razão é que a economia é liderada por um partido único?
Estas e outras questões não são de fácil resposta e, muito honestamente, após a leitura do livro não fiquei muito mais esclarecida. As palavras de Xinran têm o dom de nos obrigar a pensar e estas levaram-me de volta às mulheres que todos os dias se cruzam comigo em Pequim. Será que estas avós, mães e filhas passam provações na grande cidade? Terão elas nascido na capital ou vieram “fugidas” da pobreza do campo? Será que, apesar da opulência exterior de algumas, por dentro estão ocas de sentimentos, imunes ao sofrimento dos outros? Terão elas irmãos ou irmãs com quem partilhar alegrias, tristezas, cumplicidades? Terão um, dois ou mais filhos?
A condição feminina na China não é o ponto fulcral deste livro mas é um tema que atravessa, inevitavelmente, todos os testemunhos que nele se podem ler. Mulheres forçadas a uma vida de sofrimento, sacrifίcios e decisões que nenhuma mãe deveria ter que tomar. Fachadas de riqueza e ostentação a caminhar lado a lado com lágrimas reprimidas e sonhos destruίdos. Filhos cuja condição de “únicos” lhes dá luz verde para a arrogância, o desprezo e a ingratidão. Que sociedade é esta que coabita comigo? Gerações de “filhos únicos” numa era de novas tecnologias onde os únicos objetivos são subir mais um degrau no status social, amealhar mais uns “yuans”, vestir as últimas tendências, comprar o último grito da Apple, comprar o carro mais vistoso e potente…e, ao mesmo tempo, ver um filho como um “acessório” necessário na ascensão social, um “estorvo” que se deve deixar ao cuidado de uma “ayi” (empregada doméstic
a)…
Não se compreende como é que a primeira geração de “filhos únicos” é tão diferente da segunda e esta tão diferente da terceira. Numa era de extensas transformações sociais, abertura ao exterior e crescimento económico, os filhos desta grande nação andam à deriva, perdidos entre os conceitos de “certo” e “errado”.
Após a leitura apaixonada deste livro, fica a grande dúvida: o que será da China, destes filhos e seus descendentes? Como será o futuro da China e que papel é que estes “jovens perdidos” terão a nίvel mundial?

Aconselho vivamente a leitura desta e de outras obras de Xinran. A minha próxima já está escolhida!







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